Comprar na Shein Não É O Maior Problema E O Tal do Consumo Consciente
Desde as Revoluções Industriais, a humanidade tem produzido roupas em uma escala assustadora e cada vez maior. Essa intensidade tem causado diversos problemas ambientais e sociais, incluindo a formação de lixões têxteis em países do Terceiro Mundo e o trabalho análogo à escravidão
O vídeo e o post de hoje são para refletir sobre a nossa forma de consumo e explicar por que o "consumo consciente" não é tão fácil na prática quanto muitas pessoas costumam pregar.
O Que É Fast Fashion?
Antes de iniciarmos a discussão, é importante definir o que é a tal da Fast Fashion. Literalmente, em inglês, significa Moda Rápida e é um modelo de produção de vestuário que se consolidou no final do século 20
Apesar dos anos 90 terem evidenciado a velocidade ágil da indústria têxtil, esse ritmo acelerado pode ser observado desde as Revoluções Industriais do século 19. No futuro, talvez eu traga esse tema, já que muitos acreditam que a fast fashion surgiu do nada na década de 1990. Mas nosso foco por ora é outro.
Como as Roupas Eram Feitas Antes da Revolução Industrial?
A produção de roupas já foi um processo lento. Muitas etapas estavam envolvidas: obter a matéria-prima para a fibra, fiação, tecelagem, tingimento, corte, costura, e assim por diante. Cada uma dessas etapas era realizada por um especialista, que executava sua função de maneira bastante artesanal, por assim dizer. Se o tecido fosse nobre, por exemplo, com algum tipo de detalhe na trama, mais tempo seria necessário para sua confecção.
Com toda essa descrição, não é difícil supor que roupas eram bens de consumo muito dispendiosos e, portanto, altamente desejáveis. Inclusive, pessoas deixavam tecidos e peças de roupas como herança.
As Leis Suntuárias - Diferenciando Classes Através de Roupas
O vestuário, desde o início, foi um instrumento poderoso para diferenciar civilizações, gêneros e, obviamente, classes sociais. O ser humano sempre foi inteligente o suficiente para perceber que a maneira como se apresenta vestido pode transmitir mensagens não-verbais. E isso foi usado tanto para o bem quanto para o mal. No caso das Leis Suntuárias, foi realmente para o mal.
Tá, mas o que são essas Leis Suntuárias? São leis que puderam ser observadas desde a Antiguidade até mais ou menos o século 18 e que serviram para que monarcas, imperadores e nobres limitassem o uso de certas peças, cores e acessórios por grupos subjugados. Quer alguns exemplos?
1. Em alguns momentos da história da Roma Antiga, somente o imperador podia aparecer publicamente com trajes na cor púrpura.
2. Na Idade Média, apenas os monarcas e nobres podiam usar acessórios e roupas luxuosas.
3. Durante o reinado de Luís XIV, somente ele podia usar salto vermelho.
Leis Suntuárias foram sustentadas por meios políticos e religiosos. Em outra oportunidade, posso aprofundar melhor essa temática, caso vocês queiram.
Mas por que estou citando as Leis Suntuárias? Pessoalmente, sinto que o acesso de classes mais pobres a roupas estilosas e baratas tem incomodado a elite ao redor do mundo, que disfarça seu discurso excludente com "preocupações ambientais". É claro que essas preocupações são legítimas; entretanto, não consigo compreender o estardalhaço em torno do crescimento da Shein e o silêncio ensurdecedor em relação às polêmicas de marcas de alta costura e alta moda envolvidas em trabalho escravo e exploração. Parece que a questão é muito mais sobre quem faz do que sobre o ato de fazer.
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Consumo Consciente - O que é? Faz sentido na realidade Brasileira?
O consumo consciente hoje é resumido a comprar em brechós ou de marcas com responsabilidade de produção que trabalham no estilo slow fashion. E, se você, por algum motivo, comprar em fast fashion e lojas de departamento em geral e for descoberto, automaticamente passa a ser visto como um vilão sem coração que financia o trabalho escravo. O mais curioso é que tais acusações costumam partir de indivíduos altamente privilegiados
Consumo consciente, em tese, deveria significar fazer compras de acordo com as suas possibilidades e estar ciente de cada uma de suas escolhas, levando em consideração toda a configuração do seu recorte social. Como exigir isso de um brasileiro médio que, muitas vezes, vende o almoço para comer na janta?
De nada serve comprar em marcas supostamente ecológicas e responsáveis se a sua intenção é abarrotar o guarda-roupa com peças que nunca serão usadas ou serão usadas no máximo uma vez. A raiz do problema da descartabilidade de roupas é o consumismo desenfreado, e esse problema pode afetar qualquer um, seja você cliente da Shein ou da Dior
Marcas autorais costumam sim serem mais caras. O que vocês acham que um brasileiro pobre prefere e pode pagar? Uma saia por R$250,00 reais ou uma saia por R$80,00 reais na loja online de fora do país? Bem, acho que a resposta é óbvia, né?
É impossível pensar nas problemáticas da fast fashion sem considerar que a base dos clientes dessas redes está em países subdesenvolvidos. A fast fashion é mais do que uma causa; é uma consequência da má distribuição de renda, das desigualdades sociais e de Leis Trabalhistas frouxas nos países onde essas empresas se estabelecem para explorar. Sendo assim, acho pesado demais colocar nas costas dos consumidores pobres todos os problemas da indústria do vestuário. Até porque, essas questões são complexas demais para serem solucionadas com boicotes ou com um simples tweet feito de um iPhone, berrando aos quatro ventos sua indignação. Lembrem-se: situações de alta complexidade exigem resoluções de alto refinamento.
O mais estranho é que a Apple também já esteve envolvida em acusações de trabalho escravo, mas como é a marca oficial dos celulares das patricinhas e mauricinhos do Brasil, não se pode falar sobre isso. E o vilão e a vilã são os trabalhadores e trabalhadoras que, de vez em quando, compram algo na Shein...
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