Análise de Figurino - Legalmente Loira e A Quebra de Esteriótipos

O quadro de análise de figurino entrou em hiato por aqui e lá no canal, mas pretendo mudar isso. Não sei se posso prometer uma análise por mês, entretanto, me esforçarei ao máximo para, pelo menos, trazer um vídeo e um post sobre Moda & Cinema a cada dois meses. Vou conseguir? Não sei. Oremos! Espero que sim.

 Legalmente Loira se tornou um clássico da comédia dos anos 2000.

Até agora, só fiz análises de filmes entre 1940 e 1950, e já estava na hora de avançar, sabe? Apesar de amar essas épocas com todas as minhas forças, não podemos ignorar trabalhos relativamente recentes com uma construção de imagens muito boa. Um desses projetos é o filme Legalmente Loira (2001), do diretor Robert Luketic, que no ano passado completou 20 anos desde seu lançamento mundial. O tempo passa rápido, hein

 Elle woods com a tendência do cabelo escorrido. Reprodução.

Para celebrar o aniversário da produção e também o anúncio de que teremos Legalmente Loira 3  (esperei tanto por essa confirmação), resolvi comentar o que mais gosto visualmente nesse clássico da Sessão da Tarde.


Uma Garota Linda, Loira e Nada Burra

Antes de partir para os comentários sobre os looks, eu preciso fazer uma breve sinopse e tecer comentários a respeito do enredo. Sim, talvez tenha alguns spoilers. Mas acho que é demais não querer spoiler de um filme tão batido. A menos que você seja muito jovem ou tenha vivido em uma bolha todo esse tempo, pelo menos algumas ceninhas você deve ter visto.

A personagem principal é Elle Woods, interpretada pela maravilhosa Reese Whiterspoon. Elle é uma garota popular e muito antenada na moda. Ela tem duas melhores amigas: Serena e Margot. O passatempo favorito das três é fazer compras.

 Elle Woods e seu cachorrinho Bruiser.

Legalmente Loira trabalha com os esteriótipos de que: "pessoas bonitas não podem ser inteligentes" e que "toda loira é burra".

O mito da loira burra parece ter caído por terra - embora as piadas da loira odonto reforcem o estigma que o cabelo loiro é um traço marcante na configuração de uma patricinha. Mas vamos voltar lá pro ano de 2000...


No começo dos anos 2000, diversos filmes, programas e até mesmo músicas satirizavam loiras. E nem precisamos ir muito longe não. Aqui no Brasil, o cantor de forró Frank Aguiar (o cãozinho dos teclados), lançou uma canção que se tornou um hit.Estamos falando de "O Hino das Loiras". A música diz o seguinte: 

A mulher loira
É nota dez e preferida
Carinhosa e definida
Tem poder de conquistar
Maliciosa
Tem a força da paixão
Quando toca o coração
Faz o cabra se amarrar...


Bom, até aí parece um elogio. Mas não é!


A mulher loira
É linda por natureza
Tem um toque de beleza
Igual a ela não há
Eu não concordo
Com esse dito popular
Pois a loira não é burra
Tem preguiça de pensar...


E pam!!! Essa última frase "a loira não é burra, tem preguiça de pensar" caiu na boca do povo. Virou uma espécie de meme na época.


Particularmente, não acho que Frank Aguiar tivesse convicção de que as loiras fossem burras. Entendo que ele surfou em uma tendência de seu tempo e fez dinheiro em cima. Típico de artistas mediáticos. Nada novo sob o sol. 


Além disso, a música, apesar de proclamar que loiras são burras, o faz de uma maneira toda enfeitada. E o ritmo alegre ajuda na construção de uma áurea de "brincadeirinha" e "não é nada sério ou ofensivo".


 Elle Woods com maravilhoso vestido rosa.

Na real? Não vou problematizar, interpretem como vocês quiserem. Só quis citar como exemplo mesmo.


Na TV aberta, programas como Zorra Total, na Globo, e a Praça É Nossa, no SBT, sempre colocavam mulheres loiras em papéis de personagens com zero Q.I e muito foco no físico.


Com todo esse background, acho que dá para entender o porquê de Legalmente Loira ter sido tão necessário.


Voltando pra sinopse


Elle é convidada para jantar com Warner (Matthew Davis), seu namorado. Ela acha que naquela noite será pedida em casamento e decide encontrar o vestido perfeito. Nossa loirinha sai em busca do modelito com suas amigas e vai parar em uma boutique de luxo. Nessa boutique acontece algo muito interessante: a vendedora acha que Elle pode ser facilmente enganada.


Sem nem conhecê-la e apenas pelo o que viu, a vendedora solta uma frase mais ou menos assim: "nada me deixa mais feliz do que uma loira burra com o cartão de crédito do papai". E então, retira a etiqueta de um vestido com a clara intenção de cobrar mais caro por ele, e o leva até Elle. Só que a nossa heroína era muito esperta, sim senhor! 


 



Elle percebe o jogo sujo, desmascara a trambiqueira e mostra que pra todo mundo que vinha com o milho, ela já estava era com o fubá!


Após o episódio, Elle se direciona ao famigerado jantar e recebe um belo de um pé na bunda. Não acontecerá noivado. E o resto é história... história que eu prefiro que vocês mesmos vejam.



Uma ótima direção de arte 


Legalmente Loira não tem só um figurino bonito, toda a direção de arte esteve impecável e merece os parabéns. Nesse filme é nítido as brincadeiras com as cores para projetar emoções e personalidades. Quer ver alguns exemplos? 


1) O filme começa na Delta Nu (a irmandade de Elle), e, quando as câmeras percorrem os banheiros e quartos, os tons de rosa, amarelo e azul saltam na tela. É lindo, é pastel! E bastante agradável. Como essas cores são mais associadas às mulheres, nada mais justo do que usá-las no design de interiores de uma fraternidade feminina.


2) Em uma das primeiras aparições de Elle com as amigas, todos na cena estão coloridos, incluindo os figurantes atrás. Isso serviu para mostrar como o ambiente na Califórnia era festivo e descontraído.


 Elle Woods e suas melhores amigas.

3) Quando Elle vai para Harvard, a trilha sonora (antes mais agitada) muda para um tom sério. E a personagem, toda vestida de rosa, chega contrastando com aquele ambiente soturno - para não dizer melancólico, com uma paleta repleta de cinza, verde envelhecido e marrons.


Campus em Harvard.

Contrastes como esse são muito importantes para que o público capte, ainda que inconscientemente, o espírito de cada personagem.


Como analisei os looks mais detalhadamente no vídeo, vou fazer apenas alguns comentários gerais



Influência das Décadas de 1950 e 1960


Os fins dos anos 50 e início dos anos 60 foram bastante referenciados no filme, e talvez você nem tenha percebido. A referência mais clara é o jogo entre Marilyn Monroe e Jacqueline Kennedy, personificado nas figuras de Elle e Vivian, respectivamente.


 Elle Woods e Warner. Reprodução.

Warner (a.k.a. bundão) termina com Elle por achar que ela não é a "mulher ideal", "a mulher para casar". Ele toma essa decisão baseado em preconceitos. Para ele, Elle nunca será inteligente, e uma mulher que não é inteligente não serve para construir uma família.


 Warner. 

O problema do Warner não foi só estipular um Q.I. para escolher uma noiva; o grande problema dele foi nunca ter percebido como Elle já era bastante inteligente. Ela só precisava de um empurrãozinho, como ela mesma diz no filme: "Às vezes a gente só precisa ter um pouco mais de fé nas pessoa". Pois é, mas Warner era imaturo demais para perceber isso.


 A cena do tribunal. 

Após o fim do namoro com Elle, Warner se envolveu com Vivian, uma típica burguesa old money de família tradicional. E aí entra o jogo dos opostos.


Segundo os boatos, o presidente J.F. Kennedy teria tido uma relação extra-conjugal com a atriz Marilyn Monroe, e portanto, teria traído sua esposa, Jacqueline Kennedy.


Jackie e Marilyn eram esteticamente bem diferentes. Uma era loira, a outra morena; uma usava roupas sexy e provocantes, a outra guardava sua sensualidade. Jackie era a primeira-dama, a representação da mulher casada, estável e do lar, enquanto Monroe era atriz e vista como uma "mulher livre". Nem preciso dizer qual das duas era considerada a esposa ideal no imaginário dos meados do século XX, né?


 Cena que inspirou Ariana Grande em Thank U, Next.

Elle ficou com o papel de Marilyn, e Vivian com o papel de Jackie. Enquanto Elle usa cabelo ondulado, roupas alegres e maquiagem aparente, Vivian é representada em tons sóbrios, com roupas mais discretas (e, para alguns, até mesmo "antiquadas"), e a maquiagem é super suave."


A personagem Vivian. 

Não pude deixar de reparar na cor do batom de Elle durante o jantar. O tom cintilante de rosa me lembrou alguns batons do fim da década de 1950.


 Close na maquiagem de Elle.

E pra finalizar este tópico, a personagem Margot usa ao longo da trama o cabelo beehive hair (penteado colméia), clássico dos anos 60.


Várias referências ao mundo fashion


Se tem uma coisa que Legalmente Loira faz é referenciar o consumo de moda. Isso aparece em diversas oportunidades:


• Nas primeiras cenas do filme, quando o cachorrinho de Elle vai buscar o cartão, ao fundo vemos uma sacola da Prada.


• Revistas de moda aparecem o tempo inteiro. Na cena entre Elle e Brooke Taylor na cadeia, ela diz que a revista Cosmopolitan era a Bíblia.


 Segurando a revista Cosmopolitan.

• Já mais pro final do filme, Woods aparece com uma camisa da Givenchy.  Podemos ver pelo monograma.


 Detalhe pra camisa com monograma da Givanchy.

• E na cena do bebedouro, um certo personagem diz: "não bata seus sapatos Prada da coleção passada pra mim, queridinha". 



Não negou a moda de seu tempo


Legalmente Loira não nega o estilo de sua época. Diversos elementos centrais da moda dos anos 2000 podem ser notados, como calças de cintura baixa, camisas com estampa hip-hop, boinas, argolas, sandálias plataformas e acessórios muito brilhantes.


 Vários elementos da Moda de 2000.

Quem assinou o figurino foi a britânica Sophie De Rakoff, e esse é sem dúvidas, seu melhor trabalho. 


Texto escrito por Gabriela Lira. Caso use o texto como referência, por favor dê os créditos ao blog. Plágio é crime e está sujeito a processos.

Para referenciar use:

Lira, Gabriela. Análise de Figurino - Legalmente Loira e A Quebra de Esteriótipos. História da Moda. Disponível em: http://www.historiadamoda.com/2022/04/Legalmente-Loira-Figurino.html


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