As Silhuetas Femininas do Século 20: De 1900 até 1990
As silhuetas são fundamentais para a construção da estética de uma época. Elas carregam simbolismos que refletem o pensamento dominante de um determinado período. No entanto, é importante, antes de tudo, distinguir entre silhueta e biotipo.
Biotipo x Silhueta - Qual a Diferença?
O biotipo está relacionado à estrutura natural do corpo, determinada pelo DNA. Ele define a largura dos ombros, altura, proporção do quadril, cintura, entre outros aspectos.
Já a silhueta é uma forma construída, não natural, que pode ser moldada através de roupas e acessórios. Ela representa o contorno do corpo.
Silhueta entre 1900-1907
Na virada do século XIX, a silhueta dominante era em forma de S, e essa tendência se estendeu até meados da primeira década do século XX. A forma em S, também conhecida como ampulheta, destacava principalmente a cintura finíssima, obtida através do uso de corsets e de enchimentos colocados na altura do quadril, o que criava a impressão de que a mulher era mais estreita do que realmente era. Os corsets garantiam uma postura ereta e a elevação do busto.
Quadril, seios e cintura em destaque aparecem frequentemente ao longo da História da Moda. Essas partes do corpo feminino eram consideradas fundamentais para a reafirmação de gênero.
Foto: Reprodução.
O que se esperava da mulher dessa época era um temperamento dócil, subserviente e maternal. O corpo em S representava exatamente o ideal de romantismo atribuído à figura feminina. As saias longas também contribuíam para que as mulheres parecessem mais altas.
Silhueta entre 1907-1914
Esse período manteve a cintura marcada, porém de forma mais suave em comparação aos anos anteriores. Muitos vestidos dessa fase podem ser comparados aos modelos da Regência (início do século XIX), quando havia uma ênfase acentuada logo abaixo do busto.
O volume passou a se concentrar na região do colo, enquanto as saias ficaram mais afastadas das pernas. Na parte superior do tronco, predominavam elementos como rendas, recortes e outros detalhes ornamentais. Os babados das mangas, antes usados no dia a dia, passaram a ser reservados para vestidos noturnos, já que a nova tendência eram mangas ajustadas ao braço. O uso de faixas na cintura tornou-se muito comum.
Silhueta entre 1915-1917
Neste ponto, começa a transição para a moda dos anos 20. A devastação causada pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918) alterou profundamente a percepção da moda e as prioridades da sociedade. A silhueta desse período começou a diferenciar-se drasticamente dos modelos usados nos primeiros anos do século XX.
As saias rodadas e com babados tornaram-se muito populares, assim como as mangas mais soltas e curtas. Trajes esportivos conquistaram um lugar especial no guarda-roupa feminino. A silhueta dessa época tendia a deixar a mulher com uma aparência mais achatada.
Silhueta entre 1918-1919
A transição para os anos 20 trouxe uma mudança significativa na moda feminina. A linha do corpo tornou-se mais reta e a cintura, mais baixa. A silhueta passou a ser tubular, uma característica que se acentuou na década seguinte.
Em vestidos de festa, era comum o uso de mangas curtas e transparentes. Os vestidos diurnos, por sua vez, apresentavam muitos detalhes laterais.
Silhueta na Década de 1920
Os anos 20 foram extremamente importantes para a emancipação feminina em diversos países, especialmente nos Estados Unidos. A estética marcante do período foi a da Flapper Girl, ou Melindrosa, que surgiu inicialmente em ilustrações e, posteriormente, ganhou forma na vida real.
A melindrosa tinha um corpo reto, totalmente oposto ao do século anterior. Para alcançar esse aspecto, as mulheres usavam cintas e peças que comprimiam o busto, o quadril e as coxas. As roupas soltas ajudavam a criar uma aparência mais magra e alta.
No artigo Faces of Feminisms: The Gibson Girl and the Head Flapper in Early Twentieth-Century Mass Culture, Jenifer Palso afirma o seguinte sobre a silhueta dos anos 20:
"Michelle Mock Murton vê as roupas restritivas do século XIX como uma forma de prisão mental igual àquela estimulada pela imagem da melindrosa: 'Este fenômeno não é totalmente diferente da quimera do século XX, que criava doenças sociais para as mulheres, como bulimia e anorexia nervosa".
Pesquisas indicam um aumento de bulimia e anorexia entre as mulheres dos anos 20, em decorrência da pressão estética que promovia a imagem do corpo esquelético.
Nos meados da década, as cinturas tornaram-se baixíssimas. O que essa silhueta pode nos dizer? A mulher dos anos 20 buscava autonomia, por isso suas roupas eram mais leves e muitas foram projetadas para acompanhar os movimentos do jazz.
A melindrosa desejava se desvincular da construção tradicional de gênero, mas, sem perceber, acabou criando outra forma de padronização
Silhueta na Década de 1930
Nos anos 30, as mulheres continuaram a criar a ilusão de parecerem mais altas, com recortes abaixo do busto ajudando nessa missão. Os ombros ganharam grande destaque nessa década.
Os trajes noturnos frequentemente apresentavam decotes profundos nas costas, e os materiais mais usados na confecção dessas peças eram a seda e o cetim, que criavam um aspecto solto e fluído. Caudas longas eram uma presença constante.
Madame Grès trouxe o drapeado egípcio, enquanto Madeleine Vionnet introduziu o toque greco-romano das túnicas na alta-costura.
Silhueta na Década de 1940
A silhueta de 1940 pode ser dividida em dois períodos distintos: antes e depois da guerra. Durante o conflito, o estilo militar tornou-se popular, e o vestuário feminino passou a incorporar elementos masculinos, especialmente nos ombros
O corpo ideal na época correspondia à forma Y, com ombros acolchoados, cintura marcada e saias retas com bainhas curtas. A escassez de materiais e o racionamento de tecidos fez com que peças amplas praticamente não existissem.
O cenário mudou com o surgimento do efervescente New Look de Christian Dior, que conquistou Paris e o mundo. A silhueta de Dior se inspirou nos meados do século XIX, período lembrado por suas crinolinas.
O New Look trouxe de volta saias amplas e extremamente rodadas, que iam até as canelas. Os ombros continuaram marcados, assim como a cintura.
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Silhueta na Década de 1950
Os primeiros anos de 1950 mantiveram o New Look, e, nos meados da década, os vestidos ultrarodados eram a grande sensação. O vestido bicolor de Grace Kelly, usado no filme Janela Indiscreta (1954), representa o espírito romântico da época.
A moda housewife, ou estilo dona de casa, foi um produto do pós-guerra que buscava resgatar a antiga feminilidade nas famílias americanas e transmitir a mensagem de que o lugar da mulher era dentro de casa, cuidando do marido e dos filhos.
Usar anáguas era fundamental para criar a silhueta circular que lembrava as crinolinas do século passado.
A moda suburbana, por outro lado, apresentava jovens com estilo despojado e adeptas da calça jeans.
Os sutiãs com formato bullet bra deixavam os seios pontudos e chamativos.
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Silhueta na Década de 1960
Os princípios dos anos 60 ainda incluíam elementos da década passada, como cores pastéis e saias circulares, mas isso começou a mudar nos meados da década.
A grande característica dos anos 60 foi o vestido trapézio, que conferia à mulher uma forma em A.
As cinturas eram soltas e os vestidos se tornaram mais curtos. Surgiu a minissaia, que se tornou muito popular entre as adolescentes. Saias e shorts curtos com meia-calça branca faziam parte da estética go-go dancer.
Mary Quant e Yves Saint Laurent trouxeram a imagem da nova mulher: livre, independente e muito questionadora. As mulheres dos anos 60 não queriam mais o visual romântico e frágil das housewives dos anos 50
Silhueta na Década de 1970
Nos anos 70, o volume deslocou-se do meio do corpo para outras partes. O grande símbolo da década foi, sem dúvida, a calça boca de sino, que era ajustada até a metade das canelas e depois se alargava.
O volume também apareceu nas mangas, especialmente na parte inferior dos braços.
O smoking de Yves Saint Laurent se tornou muito popular e resgatou o aspecto estruturado da alfaiataria na moda feminina.
Silhueta na Década de 1980
A principal silhueta dos anos 80 foi a do power dressing, um movimento que buscou atender ao número crescente de mulheres no mercado de trabalho e em altos postos de liderança
O power dressing trouxe de volta os ombros exagerados e outros elementos típicos do vestuário masculino. Blazers e calças eram indispensáveis.
Podemos dizer que há algumas semelhanças entre essa estética e o estilo militar dos anos 40
Silhueta na Década de 1990
A época mais difícil de definir a silhueta com certeza é a dos anos 1990. A moda foi muito diversa nesse período, e nem sempre conseguimos traçar um cenário que contemple todas as subculturas existentes.
Escolhi falar de duas silhuetas. A primeira delas predominou nos primeiros anos da década e é típica do estilo grunge.
A silhueta do grunge era volumosa, ousava em sobreposições e trazia um toque de "desleixo". Era a voz de uma juventude inconformada que queria se livrar dos exageros das décadas anteriores.
A segunda silhueta esteve mais presente nas passarelas, especialmente nas roupas do final da década. As calças eram extremamente baixas e as peças, justas ao corpo.
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Texto escrito por Gabriela Lira. Caso use algum material do blog como referência, por favor dê os créditos. Plágio é crime e está sujeito a processos.
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Para referenciar use:
LIRA, Gabriela. As Silhuetas Femininas do Século 20: De 1900 até 1990. História da Moda. Disponível em:
https://www.historiadamoda.com/2020/11/silhuetas-no-seculo-20.html
Fontes consultadas:
A Moda na Década de 1940, editora Publifolha, 2014 - Charlotte Fiell e Emanuelle Direx.
Fashions in The 1940s, Shire Publications, 2014 - Jayne Shrimpton.
Fashions Of a Decade: 1940, Facts on File, 1992 - Patricia Baker
A Roupa e A Moda, Companhia das Letras, 1989 - James Laver
Um comentário:
tudo sempre mudando... o bom é que sempre volta!
cobaiaamiga.com
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